Max tem 38 anos. Saiu de Porto Alegre rumo a Vacaria para ensinar a menos querida das disciplinas: a matemática. Daniel tem 45 anos. Veio de Caxias do Sul, terra do empreendedorismo. Sobe a serra para sacudir as aulas de administração. O que os dois professores têm em comum? São entusiastas, apaixonados pela profissão. Enfrentam a estrada, o cansaço e o desafio de lecionar no dia e horário da semana com menor adesão dos estudantes: sexta à noite.
“A primeira aula tem que ser impactante. Como no filme Tropa de Elite. Quem não está interessado pede para sair. Quem fica, permanece comprometido, mesmo sendo sexta”, diz o estrategista Daniel, engenheiro mecânico, mestre em gestão empresarial, que leciona pela primeira vez por aqui.
Veio à cidade a convite da direção da Universidade de Caxias do Sul (UCS). “Já conhecia Vacaria, trabalhei na Invensys. É um desafio voltar para dar aula. Em cada cidade, me deparo com uma nova cultura e são novas descobertas”, revela o experiente professor, que ministra aulas há 15 anos em sete campi diferentes da UCS.
Max e Daniel são dois entre muitos docentes que vêm a Vacaria trabalhar. Dos 13 professores da Universidade Estadual do Rio Grande do Sul (UERGS) em Vacaria, sete são de fora. Na UCS, mais de 25 pegam a estrada toda a semana. Mas esses professores viajantes não são exclusivos das universidades. O Instituto Federal, os colégios particulares e as escolas da rede estadual e municipal também importam talentos. É o caso da filósofa Charlas, 35 anos. Baiana, de Valença, se apaixonou por um vacariense e veio parar nas salas de aula daqui.
“O fato de eu ser de outro estado desperta a curiosidade dos alunos. Eles me perguntam do sotaque, da comida, da minha cidade”, revela a professora, que hoje trabalha nas escolas Pe. Efrem e General Osório.
Logo que chegou, Charlas já simpatizou com Vacaria. “Gostei da arquitetura, da organização, e das calçadas, que são largas, boas para os pedestres”, analisou. Em sala de aula, o que mais chamou sua atenção foram os recursos materiais, abundantes por aqui. “Na Bahia, eu dava aulas no meio rural, faltava muita coisa”, afirmou.
Para Daniel, a concentração dos alunos foi o que mais chamou a atenção:
“Os alunos são muito atentos. Talvez por ser uma cidade pequena, com menos acesso a muitas coisas, o estudante se dedica mais”, contou. O professor é otimista em relação à cidade.
“Vacaria é uma gigante adormecida. A nossa função em sala de aula é despertar essa gigante. A cidade tem um grande potencial turístico com hospedagem rural, patrimônio histórico e as pequenas frutas. Precisamos mostrar às pessoas o quanto se pode ganhar com tudo isso”, explicou Daniel.
Já Luidi, professor de economia da UERGS e doutorando em fitotecnia, não é tão otimista assim. Para ele, o desenvolvimento de Vacaria depende muito da evolução cultural.
“Fiquei chocado quando um aluno me contou que seu empregador sugeriu que ele decidisse entre o emprego e o estudo. Felizmente, ele optou por continuar a faculdade”, revelou Luidi.
Como toda profissão, o magistério também reserva insatisfações. “Essas coisas me chateiam, mas gosto do que faço. Tornei-me professor por acaso. Entrei em agronomia na federal sem saber ao certo o que queria. Por sorte, me encantei e logo ´emplaquei´”, disse. Conversando um pouco mais com Luidi percebe-se que não foi tanto ao acaso. Sua mãe era professora, e, ainda menino, com o gabarito à mão, ele ajudava a mãe a corrigir provas.
O gosto pelas salas de aula parece estar na genética de muitos professores. Na família de Max, a mãe e a tia eram docentes. Na de Charlas, era “mainha”. “O ensino é apaixonante porque nos tira do estado de ignorância”, salienta Charlas. A filósofa cita o Mito da Caverna, de Platão, para explicar o significado e importância da profissão: o conhecimento ilumina, mostra realidades, amplia possibilidades. E é a possibilidade de mudar a vida de outras pessoas que faz com que muitos mestres permaneçam motivados. “O mais gratificante é ver que o aluno aprendeu”, diz Max, doutorando em matemática. “A nossa maior recompensa chega quando o aluno nos supera. Não devemos formar discípulos, mas mestres”, afirma Charlas. E, para isso, segundo ela, é preciso ir além do conteúdo programático. É indispensável dialogar com os alunos sobre valores, para que no futuro não sejam somente bons profissionais, mas também bons cidadãos.
por Giana Pontalti | texto escrito em abril de 2015, publicado no jornal Correio Vacariense