Mauricio Benvenutti: o vacariense que está de olho na inovação

O vacariense que fincou os pés no Vale do Silício

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O empreendedorismo pode salvar o Brasil: é o que pensa Mauricio Benvenutti. O jovem vacariense é um dos “caras” da inovação brasileira. Há quatro anos morando no Vale do Silício, berço de empresas como Apple, Airbnb, Netflix, Uber, Tesla, Google e Facebook, ele se dedica a ensinar empresas – tanto startups como gigantes estabelecidas – a questionar para inovar.

“Estamos vivendo em uma época sem precedentes: as normas e as verdades, que por décadas foram verdades, estão sendo questionadas”, salienta. E é nesse cenário de aceleradas mudanças que as oportunidades se ampliam, para todos, segundo o empreendedor.

Mauricio exemplifica as “revoluções” citando os aplicativos de corrida como o Uber e o Cabify, que questionam as leis de transporte sancionadas décadas atrás. Lembra, também, das moedas virtuais, que balançam o mercado financeiro, e as empresas de garagem que ameaçam as multinacionais. “Há pouco tempo, pagámos R$ 15 por um CD com 20 músicas. Hoje, com os mesmos R$ 15, acessamos 30 milhões de músicas através do Spotify”, destaca. O Spotify fez com que a indústria musical, em crise há 14 anos, voltasse a lucrar. As oportunidades estão por aí, facilitadas pelo acesso às tecnologias e à educação.

“As universidades não têm mais o monopólio do conhecimento. Antigamente, as famílias mais privilegiadas mandavam seus filhos estudar fora do Brasil. Com a melhora das instituições nacionais, passaram a investir nas melhores faculdades. Hoje, o conhecimento está disponível a todos. Um jovem africano, no meio do nada, mas com um smartphone nas mãos, tem acesso há tanta informação quanto tinha Bill Clinton quando foi Presidente”, pontua.

As ferramentas já estão acessíveis, basta procurá-las. “Mais de 80% do conteúdo da especialização que fiz em Berkeley – uma das universidades mais renomadas americanas – está acessível na internet”, reforça. O empoderamento, na opinião de Mauricio, está se tornando universal.

DE VACARIA AO VALE DO SILÍCIO

Aos 36 anos, Mauricio alçou voos muito mais altos do que seus pais pudessem imaginar. Saiu de Vacaria aos 16 anos para prestar vestibular para medicina. “Um professor de literatura sempre dizia que eu não tinha perfil para ser médico. Por sorte, ele me presenteou com um livro que revelava a rotina de três profissionais porto-alegrenses. Quando virei a última página, desisti da profissão”, recorda.

Logo ingressou em Tecnologia de Informação, motivado pelo irmão Rodrigo. Parte da faculdade, cursou em Vacaria; e a finalizou na PUC de Porto Alegre. E foi por intermédio de um escritório de investimentos financeiros de Porto Alegre que conheceu o Vale do Silício. Mauricio trabalhava na IBM, foi convidado a ingressar na XP Investimentos, na época, uma tímida corretora, mas com grandes pretensões. “Lembro que no início, batíamos de porta em porta, e de cada 10, nove se fechavam, e uma dava oportunidade para a gente. Mas persistimos, e tornamos a XP na maior e melhor corretora do país”, destaca. Depois de oito anos na empresa, decidiu migrar e imergir na região mais inovadora do planeta. O Vale do Silício é uma região de 80 km que engloba várias cidades entre San José e San Francisco, na Califórnia, Estados Unidos.

“Quando a gente fala em Vale do Silício, para alguém ou um grupo de pessoas, geralmente ele é associado à tecnologia, inovação, carro autônomo, robô. Morando lá, percebo que tecnologia, assim como o conhecimento, é uma commodity: existe no Vale, na Europa, no Brasil, em qualquer lugar. O que faz o Vale ser esse motor de coisas novas é a cabeça das pessoas que estão lá, a rebeldia. A predisposição delas à troca, a sua desobediência em relação ao status quo. Isso é muito difícil de ser reproduzido em outro lugar”, explica. E é nesse ambiente de quatro milhões de pessoas – metade, imigrantes – que Mauricio está.

 

APRENDER E ENSINAR: VOCAÇÃO E PROFISSÃO

Desde que se conhece por gente, Mauricio é um inconformado. “Sou um eterno aprendiz, estou constantemente buscando conhecer coisas novas. Digo que estou em versão beta, nunca estou formado. Estou sempre me reinventando”, afirma. E o Vale é um lugar favorável para quem gosta de se reinventar.

“O fluxo de trabalho lá é das 9h às 16h. Depois das 17h, as empresas promovem os MeetUps, encontros de atualização em que se pode aprender de yoga à viagem interespacial”, conta. Todos os dias, acontecem 20 ou 30 deles. “É uma ótima oportunidade para aprender e se relacionar”, explica Mauricio.

O que esse garoto tanto aprende por lá, tenta transmitir ao Brasil, recebendo grupos de empresários no Vale, como mentor na StartSe, e através de seus livros. Mauricio é o autor de Incansáveis e de Audaz, recém-lançado. Já na introdução de Audaz, ele faz um alerta: “Entenda apenas que a normalidade nunca mudou nada”.

AFICIONADO POR PESSOAS

Desde 2014, Mauricio estipulou como meta pessoal, conhecer uma pessoa por dia. Para ele, 15 minutos são suficientes para efetivas trocas. “No uber, no aeroporto, em qualquer lugar, eu chego e digo: Meu nome é Mauricio, minha vida é essa, tenho essas empresas, tenho esses problemas – o que você acha? É sensacional poder se expor, falar da minha vida e escutar a opinião das pessoas, assim como as escuto e busco contribuir de alguma forma”, explica.

Se levar a meta a sério, quando chegar aos 72 anos, o dobro da idade atual, Mauricio terá conhecido mais 13.140 pessoas. “A gente aprende tudo com elas. Sempre digo que, apesar de ter feito especialização em Berkeley, minha pós foi feita, mesmo, nas ruas”, reforça.

E são as pessoas que lhe conferem maior diversão. “Eu me divirto com as histórias delas”, confessa o jovem que não perde uma oportunidade para se conectar. No ano passado, Mauricio dedicou 15 dias para percorrer o Caminho de Santiago, de Saint-Jean a Compostela. “Encontrei muita gente, de crianças de 10 anos a senhoras de 80 que me deram uma aula de felicidade. Gente que, ganhando 0,50 centravos de euro por dia, era extremamente feliz. Eu me redescobri no caminho. Foi importante para rever alguns valores e reestabelecer os focos”, conta.

Recentemente, ele foi conferir a Copa do Mundo na Rússia. Além de vivenciar o futebol – a que adora assistir – aproveitou para conhecer o interior do país e sua gente. “Eu gosto de conversar com as pessoas, saber como vivem, o que pensam. Ficamos 30 dias na Rússia. Procurei visitar o interior e entender a sua gente”, explica.

UM DESBRAVADOR

Mauricio revela no sobrenome a sua origem: Faoro e Benvenutti. O sangue que corre em suas veias é italianíssimo. O filho de Nelson e Nara Benvenutti não nega a raça. “Meus quatro avós eram de origem italiana. Herdei a força de vontade dos italianos, que cruzaram o oceano, vieram pra cá, colonizaram uma região, todos praticamente do zero. Vieram escondidos nos navios, chegaram aqui com uma mão à frente, outra atrás, sem nada. Tiveram de construir comunidades, empregos, carreiras”, recorda.

Se o amor pelo trabalho faz parte de seu DNA, o talento pelo fogão foge à tradição. “Só sei cozinhar risoto, e de queijo, porque foi o primeiro prato que a Nathália preparou para nós. Todo o dia 26, comemoramos com o risoto. Já são sete anos juntos, e ela me disse que não ia ser a única a preparar”, conta, achando graça.

Mauricio valoriza muito a família. Fala constantemente na gratidão pelos pais e na felicidade em encontrar sua esposa Nathália. “Se sou o que sou é por causa de meus pais, que me ensinaram valores e me criaram para o mundo. Também porque herdei deles a paixão por ensinar. E pela Nathália: que parceira de vida fui encontrar”, conclui.

 

UMA PONTE ENTRE O VALE E O BRASIL

Mauricio é um otimista nato, inclusive em relação ao Brasil. Faz questão de afirmar que jamais sofreu preconceito por ser brasileiro nos EUA e que todo mundo olha o país como uma terra de oportunidades.

O jovem sócio da StartSe reforça que o Brasil está sempre em seus planos e que o grande objetivo de sua empresa é fazer a atividade empreendedora brasileira melhor. “Buscamos tracionar as empresas brasileiras, tanto as startups como as que foram criadas há 30, 40 anos, fundamentais para a nossa economia”.

A StartSe é uma plataforma que conecta empreendedores, investidores e mentores. Mauricio é um deles. O jovem também recebe grupos de empresários brasileiros que vão em missão para o Vale, em busca de informação qualificada. Palestra para todo o Brasil e compartilha informação sobre tudo que absorve por lá.

Em cada palestra, faz questão de citar sua terra natal: “Inicio ou finalizo citando Vacaria. Afinal, se sou o que sou, é por causa da formação que recebi em Vacaria e do convívio que tive com as pessoas da terra até meus 16 anos”.

Mauricio e Steve Blank, pai da metologia Startup Enxuta. Foto extraída da fanpage de Mauricio.

EMPREENDEDORISMO COMO ATITUDE

“Você pode empreender como uma família, um pai e mãe aceitando o desafio de criar uma família; pode ser empreendedor como funcionário, levando a empresa para frente, e não esperando ela levar você; ou pode ser um empreendedor criando um novo negócio”, explica.

Empreender, na opinião de Mauricio, é buscar soluções. Ele acredita que essa capacidade de aprender e empreender, todo mundo tem: “Todo mundo tem capacidade, e o mundo está tornando essa capacidade cada vez mais acessível a qualquer pessoa. Os maiores limitadores estão dentro da gente, e não fora: são muitos bloqueios mentais”, alerta.

Para Mauricio, o esporte ilustra bem o que é empreendedorismo. “Se pesquisarmos as biografias dos grandes atletas, vamos ver que eles têm algo em comum: Stephen Curry (jogador de basquete norte-americano que mais acerta cestas de 3), por exemplo, treina, treina, treina, se avalia, corrige, treina muito – e aí vem o resultado. Do céu, só cai chuva, o resto é trabalho”, enfatiza.

AMOR POR VACARIA

Mauricio diz que Vacaria é um ótimo lugar para crescer, pois é uma cidade de valores. Ele tem o desejo de dedicar mais tempo à cidade. “Tenho alguns vínculos, que podem ser mais bem explorados, com as pessoas que trabalham na Prefeitura. Posso ajudar em atividades que possam impactar os jovens, que vão construir a cidade do amanhã”, finaliza.

O empreendedor revelou que a Startse, em parceria com a Junior Achievement, desenvolveu um projeto-piloto em cinco capitais brasileiras levando as ferramentas de empreendedorismo para jovens estudantes de escolas públicas. “Antigamente, um menino e menina que nascesse na favela tinha restritas chances de ascender, tentando ser jogador de futebol, compositora, enfim. Eu vejo que o empreendedorismo é uma saída. E é por isso que nossa empresa fomenta o empreendedorismo como um todo. Levamos o conceito de startups para jovens de 14 a 16 anos de escolas públicas. A gente imaginava que os projetos iam ser bacanas, mas nunca com tanta aderência na prática”, explica.

Agora, o projeto será estendido para outras 50 cidades brasileiras. Que tal Vacaria, Mauricio? Venha pra cá e ajude a alavancar nossa cidade.

Sofá do Vale: Mauricio é entrevistado pela esposa Nathália:

PING PONG

Medo: De voar de avião. Ele enfrenta bem o medo. Só para o Brasil, vem oito ou nove vezes ao ano.
Rotina: Mauricio adora correr e, em meio à corrida, sentar-se na Golden Gate para conferir o nascer do sol. Dorme de sete a oito horas por dia.
Atualização: Não sente necessidade de saber tudo só porque trabalha com inovação. Procura saber o que lhe interessa. “Existe uma supervalorização de que tem que saber de tudo. Sei um pouco só. E quando não sei, eu falo, não vejo problema algum nisso”.
Família: É casado com a paulista Nathália, e estão planejando um filho.
Esporte: Pratica corrida, gosta de assistir futebol, é gremista. Também curte os esportes americanos: beisebol, basquete, futebol americano.
Leitura: Gosta de ler textos breves, objetivos, que apresentem rapidamente o conteúdo de interesse.
Escrever: É um trabalho de muita dedicação e transpiração.
Informalidade: Mauricio geralmente veste calça jeans, camiseta e tênis. A informalidade é a linguagem do Vale. “Grandes negócios são fechados com pizza e cerveja. O Vale me ensinou a desapegar”.
Sonho: Levar as ferramentas do empreendedorismo para muita gente.
Olhar plural: Afirma que não dá para ver milhões de pessoas passando fome e ignorar. O empreendedorismo também precisa ser aplicado nos desafios globais (fome, desigualdade, refugiados, degradação ambiental).
Fracasso: Para Mauricio, é a coragem de arriscar e a persistência em inovar que faz do Vale um lugar incrível. Fracassar faz parte. Falhar. Falir. Basta corrigir a rota e seguir.
Audaz: O livro traz as cinco características que os profissionais precisam atentar nessa nova realidade global.

São elas:
Causar impacto positivo na vida das pessoas;
Olhar a próxima curva;
Questionar em vez de dar a resposta pronta;
Fazer com as pessoas em vez de para as pessoas;
Ser diverso.

Mauricio e o pai Nelson, divulgando o recém-lançado Audaz.

 

 

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